Lá fora, tudo acalma e apenas ficam duas cores: o amarelo do pó e o castanho das pessoas locais. Esses não têm direito a ar-condicionado. Nem sequer a água potável, electricidade ou comida em quantidades aceitáveis. O seu sonho é um dia ter direito a uma camisa verde, vermelha ou azul, e ao ar-condicionado que as acompanha. Mesmo que esses privilégios sejam acompanhados pela tarefa de consumir a terra que os viu nascer, onde brincaram, estudaram e da qual se alimentaram. Nessa altura, a terra vivia do sol, agora serve para alimentar a idade do fogo. Entretanto, tudo o que sobra dela é o pó. E a esperança de que, um dia, quando voltar a percorrer as ruas - já vestidos com uma camisa colorida e a acelerar passo para chegar ao ar-condicionado - inspire um grão de pó que o viu aprender a letra "i". Aí, nesse reencontro entre passado e presente, irá perceber o futuro.
Nesses dias que estão para vir, nada será igual ao que era e ao que foi. Excepto o pó amarelo que paira no ar, tolda a vista e seca os pulmões. Mas aí já não haverá marés tricolores: apenas o castanho, o mesmo que já existia antes do pó, antes das camisas verdes, vermelhas e azuis. E depois do futuro, quando o pó amarelo começar a assentar, os que ficarem verão que, vista sob o céu limpo, azul e quente, a cidade não existe.
Há apenas um conjunto de casas e prédios e hotéis vazios, rodeados por enormes buracos - a única prova de que tudo não terá sido uma miragem? - escavados por aqueles que vestiram as camisas coloridas. O pó, esse voou para longe, levando consigo a cidade que ajudou a construir e as memórias daqueles que viveram quando ele era apenas simples terra vermelha.